Rivalidade entre travestis é rotina nas ruas de Dourados

21/08/2013 22:52 Policial

O Dourados News dá início hoje (21) a uma série de três reportagens especiais sobre a rotina na qual vivem as travestis que são profissionais do sexo em Dourados. A disputa por pontos fixos e clientes, o uso de drogas para suportar o trabalho e também o cenário de preconceitos e agressões serão temas abordados. Nesta primeira reportagem o foco é a rivalidade.

Atualmente, conforme dado da AGLTD (Associação dos Gays, Lésbicas e Transgêneros de Dourados), são aproximadamente 70 travestis profissionais do sexo que estão distribuídas pelas ruas da cidade, algumas delas vindas de outros municípios da região.

A maioria dos ‘pontos’ estão em ruas da área central da cidade, e são controlados por cafetinas. No entanto, existem as profissionais que trabalham por conta própria, sem a obrigação de pagar diária. Essas, conforme a AGLTD, são a minoria, e acabam discriminadas pelas demais, o que estabeleceu uma rotina de rivalidade que, muitas vezes, é perigosa.

“É um clima de ameaça motivado pela inveja. Quem está submetida ao pagamento de diária, e muitas vezes se submete ao ‘arrastão’ [fazer programa por qualquer preço] não aceita ver o sucesso, que muitas vezes vem rápido, de outras que fazem programa por conta própria e cobram mais. Essas são vistas como aquelas que ‘não se misturam’, o que acaba por estabelecer uma rivalidade fortíssima, que divide a classe”, explica a presidente da associação, Cláudia Assunção.

Este era o caso da travesti Marcelly Tavares, 30, encontrada morta no dia 15 dentro do próprio carro. O fato, como noticiado pelo Dourados News ontem, foi apontado pela Polícia Civil como morte acidental, já que o último cliente de Marcelly se apresentou e prestou depoimento alegando que a travesti passou mal e morreu durante o programa.

Em um primeiro momento, quando as circunstâncias da morte ainda não haviam sido esclarecidas, amigos de Marcelly relatavam em sua página no facebook que a ‘inveja’ poderia ter motivado um assassinato. Muitos chegaram a esta conclusão motivados pela realidade em que a profissional do sexo vivia. A travesti trabalhava em um ponto nas esquina da avenida Joaquim Teixeira Alves com a rua Camilo Hermelindo da Silva, na companhia de apenas mais duas colegas. O grupo ficava separado das demais travestis, e elas eram taxadas de ‘metidas’.

“Ela [Marcelly] era realmente odiada pelas demais, ela ficava só com aquelas colegas e nada mais. Xingavam muito ela, e cheguei a ouvir ‘menos uma’ de algumas travestis quando ficaram sabendo da morte dela. A Marcelly trabalhava há dois anos na rua apenas e tinha conseguido muita coisa rápido, tinha carro, não ia com qualquer cliente e por qualquer dinheiro, era bem aceita pela família e conseguiu fazer intervenções para ficar mais feminina. Então ela era muito invejada pela maioria, que se via na rua há mais de 10 anos e sem nada disso”, relata Cláudia.

A procura de travestis de outras cidades e também Estados por Dourados, acaba trazendo alguns problemas, já que essas, conforme Cláudia, são as que protagonizam, principalmente, casos de criminalidade.

“Desse grupo que a gente sempre espera o pior, e é de onde saem quase todos os casos que observamos de cliente assaltado, roubo, furto, enfim. Uma prática comum, por exemplo, é falar um valor para o cliente e quando termina o programa querer cobrar mais, o que às vezes acaba até provocando agressões físicas por parte do cliente, que não quer ser passado para trás. Esse grupo é o que se envolve em mais problemas e acaba criando muitos problemas também com as profissionais que são de Dourados”.

Para a presidente da AGLTD, apesar das constantes ações de conscientização promovidas junto às travestis da cidade, os problemas gerados pela rivalidade e disputa de ponto ainda são uma realidade muito difícil de ser mudada.

“Enquanto essa falta de consciência não mudar, e essa rivalidade, ódio e inveja dividirem a classe, todas estão submetidas a condições ruins e de risco. É preciso mais respeito no grupo, é preciso mais pensamento coletivo, e apesar de muita campanha nós ainda não conseguimos avançar nesse sentido”.

Fonte: Dourados News / Thalyta Andrade

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