PF prende 10 pessoas suspeitas de ligação com o Estado Islâmico no Brasil
Ministro da Justiça e Cidadania, Alexandre Moraes. Fonte: Isaac Amorim/Ministério da Justica e da Cidadania
A duas semanas do início da Olimpíada do Rio, a Polícia Federal (PF) realizou na manhã desta quinta-feira (21) uma operação sigilosa de combate ao terrorismo que prendeu 10 pessoas em 10 estados (mas posteriormente a PF de SP informou que fez quatro prisões), informou o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, em entrevista coletiva concedida em Brasília.
Foram as primeiras prisões no Brasil com base na recente lei antiterrorismo, sancionada em março pela presidente afastada, Dilma Rousseff. Também foram as primeiras detenções por suspeita de ligação com o grupo terrorista Estado Islâmico, que atua no Oriente Médio, mas tem cometido atentados em várias partes do mundo.
As prisões, segundo o Ministério da Justiça, ocorreram no Amazonas, no Ceará, na Paraíba, em Goiás, no Mato Grosso, em Minas Gerais, no Rio de Janeiro, em São Paulo, no Paraná e no Rio Grande do Sul, informou a assessoria do Ministério da Justiça. O governo e a PF não divulgaram os nomes dos detidos e nem para onde eles foram levados.
Por volta das 13h30, havia quatro detidos no Aeroporto Internacional de Guarulhos, em São Paulo, que embarcariam em um avião da PF. De acordo com a Polícia Federal, os suspeitos foram presos em Amparo, Campinas, Guarulhos e na capital.
Alexandre de Moraes disse que os investigados na operação não tiveram contato com membros do Estado Islâmico e que se trata de uma "célula absolutamente amadora", porque não tinha "nenhum preparo".
"Mas obviamente que não podemos, nenhuma força de segurança, ignorar isso. [...] Só o fato de começarem atos preparatórios, não seria de bom senso aguardar para ver, e o melhor era decretar a prisão deles", afirmou o ministro.
Moraes disse que o grupo mencionavam a intenção de comprar um fuzil AK-47 em uma loja clandestina no Paraguai, mas não deu detalhes sobre os "atos preparatórios" que levaram à prisão dos suspeitos.
Segundo o ministro, os investigados na operação, batizada de "Hashtag", nunca tinham se encontrado pessoalmente e eram monitorados há meses pela polícia. Eles costumavam se comunicar pela internet, pelo WhatsApp e pelo Telegram.
Questionado sobre como foi o monitoramento dos suspeitos, já que o WhatsApp foi bloqueado mais de uma vez pela Justiça brasileira justamente por não fornecer dados para investigações, o ministro inicialmente não quis responder. Depois disse que revelar como foi o monitoramento atrapalharia a investigação.
Detidos
"Hoje, culminou na primeira operação que teve como alvo uma suposta célula terrorista no Brasil. Foram presos 10 indivíduos", disse Alexandre de Moraes na entrevista concedida na sede do Ministério da Justiça.
O suposto chefe do grupo, informou Moraes, é de Curitiba. Um outro suspeito foi preso em Manaus. Um terceiro envolvido, de 26 anos, foi detido na área rural do município gaúcho de Rolante, em uma localidade chamada de Açoita Cavalo – além dos quatro detidos em São Paulo.
De acordo com a Polícia Federal, o juiz Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara da Justiça Federal do Paraná, expediu 12 mandados de prisão temporária por 30 dias, podendo ser prorrogadas por mais um mês. Moraes afirmou que os dois suspeitos ainda soltos estavam no "radar" dos policiais e que, provavelmente, seriam detidos em breve.
O magistrado também expediu dois mandados de condução coercitiva (quando a pessoa é obrigada a ir prestar depoimento) e 19 de busca e apreensão. Conforme Alexandre de Moraes, um dos mandados de condução coercitiva é contra o diretor-presidente de uma ONG para que esclarecesse palestras em que teria feito apologia ao Estado Islâmico. Por "questões de segurança", Moraes disse que não daria mais detalhes sobre a instituição.
'Atos preparatórios'
Na coletiva, o ministro da Justiça disse que os suspeitos presos nesta quinta-feira vinham sendo monitorados pela PF há alguns meses e que foram presos porque passaram dos comentários em redes sociais e mensagens de texto para "atos preparatórios" para atentados terroristas.
"Várias mensagens mostram a degradação dessas pessoas, comemorando o atentado em Orlando e em Nice, comentando o atentado anterior que ocorreu na França, postando e circulando entre eles as execuções que foram relizadas pelo Estado Islâmico", acrescentou Moraes.
"A partir do momento em que saíram daquilo que é quase uma apologia ao terrorismo para atos preparatórios, foi feita prontamente a ação do governo federal, realizando, em 10 estados, 10 prisões desses supostos terroristas que se comunicavam via internet, via grupos de Whatsapp e Telegram", disse o ministro.
Sobre quais seriam os atos que o grupo estaria planejando, Alexandre de Moraes disse que "em nenhum momento eles falaram em bomba". Segundo o ministro, "eles falavam em atirar" e, em razão disso, mencionavam a intenção de comprar um fuzil AK-47 em uma loja clandestina no Paraguai.
Moraes explicou ainda que o fato de um dos integrantes do grupo pesquisar a compra da arma pode ser considerado um dos "atos preparatórios", o que serviu de base para que os mandados de prisão fossem expedidos.
Questionado, então, sobre qual o "risco real" do grupo, respondeu: "Nós nem aguardamos [definir os locais onde o atentado ocorreria e a forma]. Você não pode aguardar isso, esperar ampliar."
O ministro afirmou que não havia, por parte do Estado Islâmico, financiamento ao grupo preso nesta quinta, somente um pedido do suposto líder para que os integrantes buscassem formas de conseguir recursos.
WhatsApp
Moraes foi questionado na entrevista sobre como foi possível monitorar as conversas do grupo por meio do WhatsApp, já que o aplicativo usa criptografia para inviabilizar o acesso às mensagens dos usuários e afirma não ter acesso ao conteúdo das mensagens trocadas.
Nesta semana, a Justiça Federal do Rio de Janeiro mandou bloquear o WhatsApp sob a alegação de que a empresa proprietária do aplicativo, o Facebook, se recusava a cumprir uma decisão judicial de fornecer informações para uma investigação policial.
"Qualquer mecanismo de investigação não deve ser falado numa entrevista coletiva para avisar um suposto terrorista sobre como se investiga. Esta pergunta [sobre como foi possível monitorar o WhatsApp] atrapalha não só esta como outras investigações. [...] Há a necessidade de uma regulamentação geral para que a Justiça consiga informações on-line, interceptações e dados do WhatsApp, porque isso facilitaria. Só que as investigações têm outros meios também", respondeu o ministro.
Juramento ao EI
Alexandre de Moraes informou na coletiva que alguns dos suspeitos presos nesta quinta chegaram a prestar um juramento, via internet, ao Estado Islâmico. Essa espécie de "batismo", de acordo com o ministro, foi feito sem que eles tivessem sequer conversado pessoalmente com integrantes do grupo terrorista.
"Aparece uma gravação e a pessoa repete [o juramento]. Não existe uma interação [...] A pessoa que faz esse juramento passa a achar que faz parte do Estado Islâmico", acrescentou Moraes.
O ministro observou ainda que nenhum dos detidos viajou para fora do país para encontrar com representantes do grupo terrorista. "Até o momento, tudo que foi investigado foi o único contato que alguns deles tiveram, o batismo [...] Eles não saíram do país para nenhum contato pessoal."
'Célula amadora'
Segundo Alexandre de Moraes, é possível concluir, com base nas informações dos serviços de inteligência brasileiros, que o suposto grupo terrorista era uma "célula absolutamente amadora" do Estado Islâmico, porque não tinha "nenhum preparo".
O ministro citou como exemplo mensagens do suposto chefe do grupo de que era necessário aprender artes marciais e atirar com armas. "E mais, qualquer célula organizada não iria procurar comprar armas pela internet", ironizou o ministro.
Conforme o titular da Justiça, o grupo não tinha contato pessoal, e só se falava pelos aplicativos WhatsApp e Telegram. Além disso, quando o líder dava as ordens, "cada um tinha que cuidar de si".
"Aparentemente, era uma célula absolutamente amadora e sem nenhum preparo, porque as mensagens eram 'vamos treinar artes marciais', 'vamos começar a aprender a atirar'", comentou Moraes.
Ele destacou ainda que, por se tratar de uma "célula desorganizada", a questão da segurança pública "é muito mais importante e gera mais preocupação do que o terrorismo".
Temer
Nas últimas semanas, o presidente em exercício, Michel Temer, tem divulgado manifestações em vídeo, por meio das redes sociais, para tranquilizar turistas e atletas em relação à segurança do evento esportivo que será aberto no dia 5 de agosto. No último pronunciamento, divulgado na última segunda-feira (18), o peemedebista que a segurança dos Jogos Olímpicos estará "muito reforçada".
Na terça-feira (19), o ministro da Justiça também tentou tranquilizar os atletas e turistas que irão ao Rio para a Olimpíada. Ele afirmou que o atentado em Nice, na França, ocorrido na semana passada, não alterou o patamar de risco de atos terroristas durante a Olimpíada. Moraes havia dito na ocasião que a classificação de risco é de probabilidade “absolutamente mínima” de terrorismo.
O titular da Justiça também havia ressaltado que os serviços de inteligência brasileiros estão atuando em cooperação com o de outros países, inclusive da França e Estados Unidos, para evitar ataques durante a Olimpíada.
Credenciamento
O Centro Integrado Antiterrorismo (Ciant), que tem sede em Brasília, fez um monitoramento nos pedidos de credenciamento para a Olimpíada.
O Ciant descobriu que 40 pessoas estão com alertas a respeito de cooperação internacional. O Fantástico mostrou, no último domingo (17), que quatro delas têm comprovadamente ligação com o terrorismo.
Elas tiveram as credenciais negadas e estão sendo monitoradas pelos serviços internacionais de inteligência. Os nomes, as nacionalidades e as acusações estão sob sigilo. O Ciant, que monitora todos os tipos de credenciamento, descobriu ainda que 61 brasileiros com mandado de prisão por crimes diversos entraram com pedido de credencial.
Na Copa do Mundo do Brasil, em 2014, houve 350 mil pedidos de credenciais. Na Olimpíada de Londres, 450 mil. Já para Olimpíada do Rio, aproximadamente, 460 mil inspeções foram feitas, sendo que, deste total, o Ciant recomendou ao comitê olímpico brasileiro que fossem negados credenciais para quase 11 mil pessoas.
Fonte: Camila Bomfim e Filipe Matoso, da TV Globo e do G1
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