Esposas afirmam que PM capixabas precisam revezar até colete a prova de balas
“A verdade é que já estamos muito cansadas de estar aqui todos esses dias, mas são nossos maridos que dão as caras nas ruas, que sobem o morro e ganham o pior salário do Brasil como PM”, desabafa Fernanda* debaixo de uma das barracas instaladas em frente ao Batalhão de Missões Especiais (BME), em Vitória. Desde sábado ela e outras mulheres e mães de policiais militares do Espírito Santo estão acampadas ali para impedir que os policiais saiam às ruas.
O grupo reivindica um reajuste do salário – que há três anos está congelado – de 43% e melhores condições de trabalho para os policiais capixabas. Sob chuva e sol, elas têm dormido no local e se revezado para que o movimento não perca força. Na noite desta sexta, o Governo anunciou ter chegado a um acordo com associações de PMs para encerrar a paralisação, entretanto, sem a participação das manifestantes. As autoridades, então, fizeram um apelo para que os agentes "conversem" com suas esposas e retornem às ruas a partir das 7h do sábado, dia 11.
“Essa manifestação começou de forma espontânea, recebemos por WhatsApp a informação que vários parentes de PMs estavam se mobilizando em todo o Estado”, conta Fernanda, abatida depois de tantas noites mal dormidas. A primeira mobilização aconteceu em frente ao Destacamento da Polícia Militar (DPM), na Serra, região metropolitana de Vitória. Lá, na sexta-feira passada, um pequeno grupo começou a protestar e permaneceu no local madrugada adentro. No dia seguinte, vários outros grupos repetiram a mesma mobilização em diferentes batalhões. Os familiares protestam no lugar dos PMs porque eles são proibidos pela Constituição de fazer greve ou paralisação. “Se eles não podem, nós podemos. Já não aguentamos mais esse descaso com os homens que cuidam da segurança da população”, explica Fernanda.
Paula*, que mora no município de Serra, onde tudo começou, veio aumentar o coro dos protestos no Quartel Central da PM, em Vitória. Ela assegura que a mobilização não foi orquestrada pelos policiais e “velada”, como o “Governo e muitas pessoas têm insinuado”. “A ideia partiu da gente. É verdade que há algum tempo já falávamos umas com as outras, porque somos nós que vemos diariamente o sufoco que eles passam. Até colete a prova de bala eles precisam revezar”, conta. O marido dela, que trabalha há 15 anos como PM, ficou feliz com o movimento de luta das mulheres pelos direitos da categoria, mas teme que, no futuro, elas possam sofrer alguma consequência.
O medo do marido de Paula tem fundamento. Na manhã desta sexta-feira, o secretário de segurança do ES, André Garcia, endureceu o tom com os policiais militares e as manifestantes. Ele informou que as mulheres serão penalizadas pelos custos gerados pela paralisação dos policiais e deu um recado: "Estamos identificando com imagens e diversas já foram identificadas. As imagens serão encaminhadas para o Ministério Público Federal”. Dias antes, o secretário já havia responsabilizado o movimento pela onda de violência desencadeada nos últimos dias. Em uma semana, mais de cem pessoas foram assassinadas. “Coloco essas ocorrências e mortes na conta do movimento", disse.
Paula assegura, no entanto, que o que ela chama de “jogo psicológico” feito pelo Governo não irá enfraquecer o movimento. “Eles estão tentando colocar a sociedade contra a gente. Mas nós estamos lutando pelo direito que é dos policiais e, como o Governo não cede, quem sofre é a população que fazemos parte. Também estamos sofrendo”, diz ela, que espera que o impasse não se prolongue.
Com o caos instaurado no Estado, os capixabas vivem uma espécie de estado de sítio, que divide a população entre os que são a favor e contra o movimento. Com isso, as mulheres sofrem certa hostilidade de alguns moradores, mas afirmam que a maioria das pessoas as apoia. “Muita gente vem aqui trazer alguma coisa para a gente comer, vem cumprimentar. Nos últimos dias também recebemos o apoio da Polícia Civil e dos Bombeiros, os carros passam aqui buzinando”, conta Bárbara*. O movimento também foi ganhando uma presença maior de crianças e de homens, amigos ou familiares dos PMs. “Como estamos ficando tanto tempo aqui, longe das crianças, resolvemos trazê-las, ainda mais porque estão todos sem aula”, conta Bárbara.
Cansadas das diversas negociações que aconteceram essa semana entre representantes do movimento e do Governo sem resultado algum, as mulheres dos PMs acreditam que nesse cabo de guerra entre o Governo e os policiais militares, a corda deve acabar soltando do lado dos mais fracos.
Temor a reivindicação de outros servidores
Irredutível desde o início da mobilização, o governador Paulo Hartung já afirmou que o aumento do salários dos PMs é inviável e não cabe no orçamento. Hartung calculou ainda que, para atender a reivindicação da categoria, o Estado teria que arcar com um custo de cerca de meio bilhão de reais, que desequilibrariam as contas do Governo e feriria a lei de responsabilidade fiscal.
O Governo alega ainda que fazer concessões agora poderia abrir um precedente perigoso que poderia colocar em risco todo o esforço aplicado para manter as contas no azul. No ano passado, o Espírito Santo foi um dos únicos Estados a fechar o ano com um resultado primário (a soma entre as despesas e as receitas) positivo. Caso ele cedesse para os militares, teria que reajustar os salários de todos os servidores públicos que estão congelados desde o início do seu mandato.
Segundo a assessoria do Executivo, a alocação de recursos para a área de segurança foi uma das poucas que tiveram crescimento nos últimos anos. Passou de 1,8 bilhão de reais, em 2014, para 2,27 bilhões no ano passado. Atualmente há, na ativa, cerca de 10.000 policiais, sendo 2.000 por dia nas ruas, em escala.
PRINCIPAIS REIVINDICAÇÕES DO MOVIMENTO
- Melhores condições de trabalho;
- Reajuste salarial: 43% de aumento;
- Auxílio-alimentação;
- Adicional por periculosidade e insalubridade;
- Adicional noturno
- Plano de saúde
- O movimento das mulheres dos policiais militares reclamam também que eles são obrigados a arcar com as despesas no caso de batida da viatura policial.
- Elas alegam ainda, que os policiais precisam fazer revezamento de coletes a prova de bala, o que faz com que eles saiam de casa para o trabalho sem coletes correndo risco.
*As entrevistadas falaram com a condição de anonimato por questão de segurança.
Fonte: Por Heloísa Mendonça, do El País
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