Oito renais crônicos morrem na fila do transplante

14/07/2014 08:34 Saúde

Com o serviço de transplantes parado em Mato Grosso do Sul desde o início do ano, pacientes morrem na fila de espera. Em Dourados, 8 renais crônicos perderam suas vidas em seis meses (janeiro a junho). Como se não bastasse, apesar de Dourados ter duas clínicas particulares dispostas a oferecer o serviço, 40 pacientes continuam enfrentando verdadeiro “calvário” para fazer o tratamento em Ponta Porã, já que em Dourados as vagas estão esgotadas. Para a contratação de novas vagas a Prefeitura precisa de recursos do Estado e da União.

O secretário de Saúde de Dourados, Sebastião Nogueira, disse ao Douradosagora que como a obrigação é da tripartite (Estado, União e Município), está recorrendo aos governos Federal e Estadual em busca de mais investimentos para o setor. Ambos estão avaliando a contratação ou da Cassems, que teria 36 vagas para oferecer, ou a nova Clínica do Rim, com mais de 150 vagas. Por enquanto, sem uma resposta, os pacientes vão continuar sendo deslocados para Ponta Porã.

A dona de casa Cleide da Silva Santos é irmã do renal crônico José Barbosa. Ela conta que o irmão passa 3 horas numa máquina de hemodialise e cansado ainda precisa enfrentar a estrada a caminho de Dourados, já que faz o tratamento em Ponta Porã. “É um sofrimento sem fim. Um verdadeiro castigo”, conta.

A demanda de novos pacientes cresce a cada dia. Em 11 de outubro do ano passado, a Clínica do Rim ampliou o serviço com 5 novas máquinas de hemodiálise, garantindo 30 novas vagas. O problema é que elas não foram suficientes para atender a demanda. A Clínica do Rim abriu uma nova filial e está habilitada para oferecer o serviço, mas depende da contratualização do serviço pela Prefeitura através do Hospital Evangélico.

Transplantes

Para agravar o problema dos renais, os transplantes de rins estão parados em Mato Grosso do Sul e deixam 400 pacientes na fila de espera. A suspensão do serviço ocorreu no início desde ano e, por isso, nenhum transplante de rins foi realizado no Estado de lá para cá. O problema é ainda mais grave porque as equipes de transplante que realizavam o serviço foram descredenciadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) e ainda não há uma previsão de quando o serviço será restabelecido no Estado.

De acordo com a coordenadora da Central de Transplantes, Claire Miozzo, a Santa Casa, que é a responsável pelo serviço, está formando novas equipes para buscar o credenciamento, mas ainda não existe uma previsão de quando esta etapa será finalizada. Enquanto fica suspenso o serviço, os mais de 400 pacientes que precisam de um transplante ‘amargam’ à espera. Em Dourados, 230 pacientes estão cadastrados e prontos para o transplante em doador cadáver, mas não têm previsão de quando poderão realizar a cirurgia. Se esta espera é angustiante para estes pacientes, é ainda mais frustrante para quem tem doador vivo. Isto porque os pacientes enfrentam verdadeiro “calvário” para conseguir tratamento fora.

Busca pela vida

Na busca pela vida, 21 pacientes de Dourados estão sendo “exportados” para São Paulo e Curitiba com a finalidade de realizarem os procedimentos clínicos para transplantes. Destes, 8 são com doador vivo. O problema é que a assistência prestada pelo Estado é limitada e os pacientes precisam arcar com altas despesas devido à locomoção.

Recentemente a presidente do Conselho Municipal de Saúde de Dourados, Berenice de Oliveira Machado Souza,disse que sente na “pele” a desassistência em relação aos pacientes renais. Ela luta há quase 5 anos pelo transplante de rim do filho de 32 anos. Fato que chama a atenção é que o jovem tem o doador vivo, que é o pai, o que demonstra que a cirurgia não é fácil de ser conseguida nem para quem tem o doador.

Berenice diz que a cada ida para São Paulo ela gasta em torno de R$ 1 mil, despesa que arca com o próprio bolso. Segundo ela, o Estado fornece a passagem de voo e uma diária de quase R$ 25 para que o paciente e o acompanhante se mantenham. “O problema é que uma diária em qualquer hotel próximo do Hospital do Rim não sai por menos de R$ 180. Ai vêm as despesas de locomoção e a refeição, que custa muito mais do que R$ 25. A cada viagem tenho que ir para cuidar do meu filho e o pai dele, que é o doador, vai junto para os exames rotineiros”, explica.

Conforme Berenice, em média, são 4 dias em São Paulo. “São exames de compatibilidade e uma infinidade de consultas e acompanhamentos que precisam ser feitos pelo menos uma vez por mês no Estado vizinho”, disse.

Ela conta que o Estado fornece as passagens de ida e o costume é que quando terminam as consultas os pacientes entram em contato para pedir as passagens de volta. “O problema é que o serviço do Estado funciona somente pela manhã e, muitas vezes, o paciente só termina as consultas à tarde. Então, temos que pagar mais uma diária em hotel, ou então, quando não se tem, temos que ir para o aeroporto e esperar por lá.

Será que alguém sabe o que é ficar 13 horas num aeroporto com um paciente renal crônico que acabou de passar por uma série de tratamentos e, por conta disso, está debilitado?”, indagou. Berenice disse que os pacientes reclamam e que afirmam estar morrendo aos poucos. “É muito triste ver como os pacientes renais são tratados. Em Dourados, o Conselho de Saúde está aguardando a Prefeitura assumir a gestão do Hospital da Vida para iniciar a formação da equipe de captação de órgãos. O Conselho também aprovou a contratualização do SUS no Hospital da Cassems para o tratamento de hemodiálise e luta para que o serviço de transplante seja implantado em Dourados, o que vai depender do Hospital Evangélico”, destaca.

O presidente da Associação dos Renais Crônicos de Dourados (Renasul), José Feliciano Paiva, disse que os pacientes estão revoltados com a suspensão do serviço. Segundo ele, o transplante é a única chance do renal crônico sobreviver à doença. “Para os transplantados, como eu, é muito difícil ver que os companheiros que ainda precisam da cirurgia não vão sair da máquina de hemodiálise. Muitos desistem do tratamento, entram em depressão e desistem de esperar; desistem de viver este verdadeiro calvário que é fazer o tratamento em Mato Grosso do Sul”, lamenta, pontuando que, somente em 6 meses, 11 pacientes de Dourados morreram na fila do transplante no ano passado.

 

Fonte: Valéria Araújo/Dourados Agora

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